Peço sua ajuda: como entender o ceticismo espiritual?

Publicado em 22 de março de 2008 e atualizado em 7 de março de 2024

Imagem representando o ceticismo

E quem garante que a crença mais estranha de todas não seja o ateísmo, que nem explica os mistérios nem conforta os espíritos?

A citação acima é de autoria do escritor Luís Fernando Veríssimo em sua postagem Bombons. Lembrei-me dela vivenciando a situação que passo a descrever.

No início de 1975 a profissão de meu pai nos obrigou a uma nova mudança de cidade, de estado e de região, a quarta nos meus oito anos de vida até então. Deixávamos Porto Alegre, onde vivemos dois felizes anos, para voltar a nossa terra-natal, São Paulo.

Foi andando de bicicleta pelas ruas do bairro que conheci um menino cuja amizade perduraria pelas décadas seguintes. Nossa amizade é tão íntima e sólida que costumeiramente tratamos um ao outro como “amigo-quase-irmão”.

Quis o Senhor nosso Pai que minha família fosse novamente transferida, desta vez para o Nordeste, em meados de 1982, quando não pude mais conviver com meu amigo-quase-irmão. A partir de então nossas conversas passaram a ocorrer por carta. Mais tarde, em meados da década de 1990, o e-mail passou a ser a ferramenta que manteria acesa a chama de nossa perene amizade.

Mas foi só em meados de 2002 que comecei a abordar o assunto religião em nossas conversas. Foi então que descobri nele uma faceta até então desconhecida para mim: o ceticismo.

Em seu perfil no Orkut ele se definia como agnóstico. O dicionário Houaiss define agnosticismo como:

Doutrina que reputa inacessível ou incognoscível ao entendimento humano a compreensão dos problemas propostos pela metafísica ou religião (a existência de Deus, o sentido da vida e do universo etc.), na medida em que ultrapassam o método empírico de comprovação científica.

Refletindo sobre o falecimento de seu pai, ocorrido em 2001, ele provavelmente sentiu que o agnosticismo não o definia muito bem, então passou a se definir como tendo “um lado espiritual independente de religiões”.

Meu amigo-quase-irmão é bastante refratário em relação a religiosidade. Já teve uma namorada evangélica e conta não ter gostado do que viu na fé praticada pela moça e na igreja frequentada por ela. Também não deve ter gostado dos maus exemplos de fanatismo religioso observados em todo lugar e não o culpo por isso. Deve imaginar que, se adotar uma religião, acabará se tornando naquilo que não gosta de ver.

O problema é que ele extrapola essa impressão para tudo que diga respeito à fé, apressadamente julgando todo o conjunto como sendo uma coisa só.

Fé, aliás, segundo ele próprio, é um conceito “etéreo demais para minha cabeça”.

Ele diz crer que existe um Deus, mas nega Seu poder de falar com o homem. Quando lhe conto que Deus falou e fala comigo, já que tem boca e fala, ele não acredita. Quando digo que Jesus é o Cristo e Salvador da humanidade (dele inclusive), faz pouco caso. Quando insto-o a estudar as escrituras e orar para conhecer melhor o Deus no qual diz crer, recusa-se. Quando explico que precisa se arrepender e obedecer aos mandamentos de Deus caso queira ser favorecido por Ele, rebate dizendo que já os obedece. Quando explico que ser um bom marido, pai e cidadão não é suficiente para alcançar a graça do Pai, ele nega. Ainda assim, insiste em achar que está de bem com Deus e que não há nada que precise fazer para obter Dele as graças que deseja.

Em outras palavras, meu amigo-quase-irmão criou para si uma divindade que não lhe exige nada, que lhe permite viver como quiser e que se adapta a ele conforme a conveniência dele.

Em dado ponto de nossa conversa, ele começou a rebater meu testemunho dizendo saber que estava certo em suas atitudes. Embora eu sempre tenha lhe oferecido minha justificativa para minha mais plena e absoluta certeza de que estou cumprindo a vontade de Deus ao obedecer Seus mandamentos, ele nunca me apresentou a justificativa dele, por mais que eu insistisse. Não acredita que Deus fale comigo pelo Espírito — afinal, se não fala com ele, por que falaria comigo? — e, se fala, o que quer que me diga não lhe serve. Até então ele se limitava a dizer “sei que estou certo e pronto”. Eu sabia que o fazia só por pirraça. Como nunca buscou em Deus respostas para perguntas que não tem, não tinha o que dizer como justificativa para sua teimosia, por isso não dava resposta alguma além de “sei que estou certo”.

Mas ele traiu a si mesmo ao dizer: “Como sei se estou certo? Eu sei, e somente o tempo dirá se eu realmente estava certo ou completamente equivocado.”

Foi aí que o apanhei na falácia lógica com a qual enganava a si mesmo: se ele depende do tempo para avalizar ou não sua certeza, não pode dizer que sabe que está certo. Se soubesse, não precisaria do tempo para isso.

Portanto, embora alegasse saber que estava certo, na verdade não sabia de coisa alguma. Ainda assim, contrariando a lógica, insistia e ainda insiste em permanecer no atual curso de ação mesmo não sabendo para onde vai. Dá de ombros para as perspectivas futuras. Não se importa com seu destino. Tal qual barco à deriva, prefere a postura do “o que vier, veio, seja bom ou ruim”.

Como pode alguém viver assim, sem rumo nem metas, sem propósito nem sentido para a própria vida, deixando-se governar pelo acaso?

A pior parte é saber que ele é dotado de soberba inteligência. Eu entenderia esse tipo de atitude fosse ele um iletrado ignorante desprovido dessa inteligência. É justamente nesse ponto que sua postura contraditória me intriga: essa atitude não é inteligente. Não há inteligência no ceticismo espiritual. No caso dele e seguramente no de muitos outros como ele, as peças desse quebra-cabeça não se encaixam.

Em minhas ponderações sobre como ajudá-lo a arrancar a venda de sua autoimposta e lamentável cegueira espiritual, várias hipóteses me vieram à mente. Uma delas é a de que tem medo. O medo faz com que permaneça na ignorância, que por sua vez o mantém refém da comodidade de sua zona de conforto. Faz sentido, pois em outras oportunidades já demonstrou ser resistente a mudanças. Prefere não conhecer suas responsabilidades perante Deus para não ter que cumpri-las, crendo, assim, poder se justificar dizendo que não sabia de nada. Mas essa também não é uma atitude inteligente. Como burro ele não é, tem que haver outra explicação. Como sabemos, “é impossível ao homem ser salvo em ignorância” (D&C 131:6).

A hipótese que parece fazer mais sentido não diz respeito a seu intelecto, mas a seu espírito. Talvez a origem de seu problema remonte aos primórdios de sua existência como espírito, na época em que Jeová — nome de Jesus Cristo antes da mortalidade — e Lúcifer duelaram na grande batalha que houve nos céus quando a proposta de Jeová para ser nosso Salvador foi aceita e a de Lúcifer rejeitada, razão pela qual Lúcifer, antes conhecido como “estrela da manhã” (Isaías 14:12), tornou-se Satanás (D&C 76:25-29; Moisés 4:1-4; veja também o excelente artigo A Rebelião de Satanás). O fato de meu amigo estar vivo neste mundo hoje pode ser prova de que não optou por ficar do lado perdedor, mas quão valente teria sido ele em abraçar a causa vencedora? Seria essa compulsão obsessiva pelo ceticismo cego e irracional mero reflexo de seu passado pré-mortal?

Eis porque venho pedir sua ajuda, caro leitor.

Mesmo que você não partilhe de minha fé, eu gostaria de conhecer sua opinião. Por favor, dispense cinco minutos de seu tempo utilizando o espaço de comentários mais abaixo para compartilhar comigo e com os demais leitores seus pensamentos. Quem sabe eu consiga extrair desse conjunto de opiniões alguma coisa que me ajude a compreender a atitude ilógica de meu amado amigo-quase-irmão. Quero munir-me de mais conhecimento para poder ajudá-lo. Não suporto a idéia de que venhamos a ser separados na eternidade por causa de atitudes das quais ele se arrependerá depois.

Como disse o Pres. Spencer W. Kimball: “Às vezes esquecemos que é melhor corrermos o risco de criar uma pequena perturbação no relacionamento com um amigo do que o privarmos da vida eterna ao permanecermos em silêncio” (Ensinamentos dos Presidentes da Igreja: Spencer W. Kimball, Proclamar o Evangelho).

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16 comentários em “Peço sua ajuda: como entender o ceticismo espiritual?

  1. Acho correto não agnósticos como certos ateus não passarem também a cacarejar em cima desta religião saudável e elegante que talvez respeita e está mais perto de tal Deus que muitas pessoas.

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